terça-feira, 19 de maio de 2009

UM CASO DE AMOR COM O VIOLÃO E COM O SUBÚRBIO

Texto e foto: Cássio Cornachi - Técnicas de Reportagem - EQUIPE RUBI

GENTE NOSSA
ENTREVISTA COM CÍCERO PEREIRA

Cícero Pereira, 56 anos, músico. Ele é o foco de nossa entrevista hoje. Há 24 anos lecionando música em Turiaçu, Cícero, mais conhecido como Pereira, é considerado um ícone no bairro. Sempre com um sorriso estampado no rosto e esbanjando talento, sem dúvidas representa o que é o povo da Zona Norte. Ele se considera um andarilho, nasceu no Engenho da Rainha, passou por Oswaldo Cruz, Austin, São Cristovão e atualmente reside na Estrada do Otaviano 285, mesmo endereço onde ensina teclado, cavaquinho, violão, bateria de jazz, guitarra e contra-baixo, de segunda a sexta, das 14 às 22 horas.

Jiló Press: Quando surgiu a paixão pela música?
Pereira: Desde sempre, nasceu comigo. Sempre vivi na música, ia pra escola e carregava o violão. Uma senhora que vem aqui, Dona Virgínia, não entende o que a música representa pra mim, inclusive os parentes também não entendem, são pessoas normais, não tem a sensibilidade para sentir isso. Não sinto prazer em sentar com os amigos pra conversar se não estiver com meu violão. Por exemplo, é como um aniversário, eu vou lá mas não fico por muito tempo, mas se eu tiver lá, parar e tocar, posso ficar até 5 dias. Quando era pequeno eu andava com quem era ligado a música, ficava até as 4 da manhã no portão tocando violão. Onde eu for levo o violão.

Jiló Press: Adquiriu maior respeito das pessoas depois que começou a lecionar?
Pereira: Existem vários mundos dentro do mundo. Dois deles são mais percebidos: o material e o espiritual. Somente os que fazem parte do espiritual dão valor à música e ao músico. É como amar, o rapaz está lá com os amigos, passa uma mulher bonita e se ele disser que a ama não é bem visto pelos amigos, mas se disse que não ele será mais respeitado. Assim como o amor não é visto como uma coisa boa, a arte e quem vive da arte também sofrem discriminação. As pessoas gostam de falar de posses.

Jiló Press: Como é a relação com os alunos?
Pereira: Difícil. Já chegam com uma certa idade, chegam para executar e não para aprender, o convívio é complicado, principalmente nos primeiros meses. Procuram a música por diversão e não por aprendizado.

Jiló Press: Quando decidiu dar aulas de música e por quê?
Pereira: A decisão de passar o aprendizado surgiu quando eu tive a certeza dos benefícios que a música me trouxe. Eu senti vontade de lecionar, é muito satisfatório ver as pessoas conseguirem o que você conseguiu. Me sinto bem fazendo-as se sentirem felizes.

Jiló Press: Com o crescimento do funk, há perda ou ganho de identidade para o Brasil, que é conhecido pelo Samba e MPB?
Pereira: O funk não é música. É um elemento da música. A música é dividida em três partes: harmonia, melodia e ritmo. O funk é o ritmo. O que causa tristeza para os músicos é que uma parte dos que tocam esse ritmo abusam do apelo sexual e do estímulo a violência. Mas o funk não causa perdas, ele não tem culpa de ser usado dessa forma.

Jiló Press: Você, de certa maneira, é responsável pela formação do caráter dos mais jovens que aqui estudam. Procura passar pra eles um pouco do seu conhecimento sobre a vida?
Pereira: É claro. A música é fundamental nisso, a primeira comunicação de um ser com o outro é através do som, da fala. A criança escuta a mãe cantando. A base da escola de música é a educação, o respeito e o comportamento.

Jiló Press: Tem alguma composição gravada?
Pereira: Várias. Eu tinha uma banda, a Banda Rabo de Saia, nós lançamos um LP em 1985, em Lisboa (Portugal), nosso público era maior na Europa, porque lá o público sempre foi mais profissional, aqui é mais amador. O intérprete de samba Rico Medeiros gravou uma música minha, chamada Feliz por um dia, eu gravei uma também, de autoria minha, Imaginário Super Som, ela é assim '... eu criei um mundo novo, imaginário super som, vibrando com a fabulosa super quinta dimensão...'.

Jiló Press: Acredita que a inserção de jovens moradores de áreas consideradas de risco em programas de inclusão digital seria o passo principal para a diminuição da violência no estado?
Pereira: Claro, principalmente na música. Mais do que no futebol, o futebol é mais atlético, é excelente, porém atlético, 80% do futebol é físico, na música é diferente, 80% é espiritual. Essa é a diferença.

Jiló Press: Como músico, o que te deixa mais feliz e o que te deixa mais triste?
Pereira: O que me deixa mais feliz é saber que as pessoas que tem sensibilidade conseguem entender o sentido da música e levar paz, amor e felicidade para todos. E o que me deixa mais triste é que poucas pessoas tem sensibilidade para entender a mensagem que a música passa.

Jiló Press: E como professor? O que te deixa mais feliz e o que te deixa mais triste?
Pereira: Fico feliz quando consigo ver uma pessoa chegar sem conhecimento sobre música e, em pouco tempo, vê-lo ter o sonho de tocar realizado. E fico triste quando alguem talentoso renuncia a esse talento, renuncia a uma coisa tão rica como a música.

Jiló Press agradece o carinho e respeito e deseja felicidades a você, Cícero Pereira.
Pereira: Desejo muitas felicidades a todos e que seus sonhos se realizem. E que o estudo dê toda a felicidade do mundo para vocês.

4 comentários

Anônimo disse...

Cássio, sensacional a entrevista.
Falta isso no nosso Jiló: falar de gente. Da nossa gente, aqui da Zona Norte. Nossos valores anônimos. Excelente entrevista. Excelente lidão, em que vc traça o perfil do entrevistado, com detalhes. Que essa entrevista paute outras do mesmo nível. É um exemplo a ser seguido pela equipe do Jiló Press. Temos como melhorar o vídeo, com mais luz? Parabéns!

Ricardo França
Editor-chefe
Agência de Notícias Zunido
Rede Jiló Press de Comunicação
(Internet/Rádio/TV)

Cássio Cornachi - Técnicas de Reportagem - EQUIPE RUBI disse...

O vídeo dá pra clarear no Media Player, mas tentei com o VirtualHub e a qualidade não ficou a mesma, infelizmente

Cássio Cornachi - Técnicas de Reportagem - EQUIPE RUBI disse...

VirtualDub*

Eloana Proença disse...

parabens Cassio, otima matéria... continue assim

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