domingo, 26 de julho de 2009

'MÃES SIM, ALUNAS TAMBÉM'

Bruna, Elaine e Magda: mães adolescentes na escola com seus filhos
'MÃES SIM, ALUNAS TAMBÉM'
REPORTAGEM - GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA
Texto e fotos: Viviane Teixeira Chaves

Quatorze anos e uma descoberta: grávida de dois meses. Bruna Laís da Silva Monteiro passou por esse drama há seis anos. Ainda cursava a 8ª série, quando descobriu que daria luz a uma criança. Atordoada com a novidade, Bruna pensou em fazer um aborto, mas como descobriu um pouco tarde, o medo de que o filho nascesse com alguma deficiência, foi maior. Diante disso, a adolescente tomou a seguinte decisão: a de assumir a maternidade.
Ultimamente, é comum encontrar na rua, no bairro, na faculdade, na escola ou no trabalho, pelo menos uma menina com menos de 21 anos que já tenha se tornado mãe ou que esteja grávida. Por causa disso, muitas jovens se veem obrigadas a deixar os estudos de lado para cuidar dos filhos. Isso acontece porque, dificilmente, encontra-se uma pessoa confiável para ficar com a criança.
PRECOCIDADE – A gravidez precoce é considerada um caso de saúde pública no Brasil. Em 2002 e 2003, foi feito um último levantamento sobre o tema pelo Sistema de Informações de Nascidos Vivos (Sinasc), do Ministério da Saúde. Foi registrado um total de 3.059.402 e 3.038.251 nascidos vivos, respectivamente. Destes, 693.101 (22,7%) e 673.045 (22,2%) eram filhos de mães adolescentes, entre 10 a 19 anos. Em cada um desses anos, 0,9% dos nascidos vivos foram de mães entre 10 e 14 anos. Já em 2002, foi verificado que 21,8% dos nascidos vivos eram de mães entre 15 e 19 anos. Em 2003, 21,3% dos nascidos vivos foram de mães nessa faixa etária.
A Região Norte apresentou o maior índice de gravidez na adolescência (10-19 anos), com 29,6% e 29,1%. Em segundo, a Região Centro-Oeste, com 24,1% e 23,3%. Destaca-se também a Região Sudeste com a menor proporção de mães no mesmo grupo de idade, de 19,2% e 18,3% nos anos de 2002 e 2003, respectivamente.

Tendo em vista esse cenário e consciente da importância de se concluir o ensino médio, a Instituto Normal Estadual Carmela Dutra, localizada na Avenida Edgard Romero, em Madureira, criou o “Carmelinha”, escola que vai até a 4ª série e que fica nos fundos do colégio e é aberta para os filhos das alunas e funcionárias do local.

– O Carmelinha foi criado pelo antigo diretor, o professor Geraldo Ribeiro. E eu dou total apoio – afirma, com entusiasmo, o diretor-geral da escola, professor Marcelo da Silva Lisboa.

O Carmelinha foi construído há nove anos. Começou como uma creche, chamada Joaninha, onde apenas os bebês das alunas eram atendidos. O sucesso do projeto fez a escola investir mais. De acordo com a orientadora educacional do Carmelinha, pedagoga Flávia da Conceição Domingos Dias, o número de alunos totaliza 417.

– A procura fez a escola aumentar. Hoje, o número de alunas que têm filhos matriculados aqui se aproxima a 20. Considero essa iniciativa um exemplo para outras escolas. É uma oportunidade para que essas adolescentes concluam o normal e possam, futuramente, oferecer uma vida melhor aos seus filhos. Além disso, a escola só tem a ganhar. O Carmelinha, este ano, tornou-se um colégio de aplicação. Cada aula é assistida por duas normalistas. É uma espécie de estágio para que as meninas tenham contato com a prática – explica Flávia.

Elaine, Bruna e Magda aprovaram a iniciativa da creche Carmelinha

Bruna Laís, hoje com 19 anos, é uma das alunas normalistas do Carmela Dutra. Seu filho, Alexandre Monteiro Cavalcante, 4 anos, é um dos estudantes do Carmelinha. A jovem garante que ter um lugar para deixar o filho, é um presente. A mãe precoce se sente segura em saber que Alexandre está no mesmo lugar que ela. Outro motivo que não pode ser descartado é a ótima oportunidade para dar prosseguimento aos estudos, fator que angustiou a menina ao receber o resultado do exame de gravidez aos 14 anos de idade.
– Eu fiquei sem chão. Fiz o teste de farmácia e, quando vi que era positivo, me desesperei. Foi péssimo. Não sabia como contar para os meus pais. Pensei em como seria o meu futuro a partir daquele instante e acho que foi por isso que pensei primeiro em abortar. Minha mãe ficou duas semanas sem falar comigo. A família toda ficou chocada. E eu, com muita vergonha disso tudo, é claro – recorda.
Outra normalista grata à iniciativa do Carmela Dutra é Elaine Regina Moledo Pinto, 21. A aluna engravidou aos 17 anos. Já se passaram quatro, mas a lembrança do constrangimento de ter engravidado nova ainda é viva em sua memória. Elaine lembra o quanto foi criticada pela família e amigos. Porém, segundo ela, o medo de ter o futuro prejudicado e não ter nada de bom para oferecer à filha a assustou muito mais.
– O clima lá em casa foi só decepção. Não teve uma pessoa da minha família que não pensasse: “a Elaine, tão inteligente, grávida?” Quando minha filha nasceu, tive que interromper meus estudos, porque minha mãe não ficava com a menina. O único apoio que minha mãe me deu foi financeiro. Tive medo, mas fui obrigada a abrir mão da escola. Alguém tinha que cuidar da minha criança, – desabafa Elaine, mãe de Beatriz Pinto Corrêa, 3.
Apesar do susto, Elaine não pensou em aborto. Ela tinha consciência do que tinha feito e, desde o momento que soube da notícia, assumiu a maternidade. Segundo Elaine, ela só voltou a estudar porque conseguiu matricular a filha no Carmelinha. A ex-sogra ajudava a cuidar da menina, mas não era sempre que a avó podia. Então, optou por esperar até que Beatriz tivesse idade suficiente para ingressar no Jardim I.

– Estudamos no mesmo turno. Isso facilita muito. Uma vez ouvi dizer que a iniciativa do Carmela Dutra incentivava a gravidez. Isso é uma tremenda ignorância. É totalmente o contrário, é um passo para que o jovem não pare de estudar. Eu sou um ótimo exemplo. Se o Carmela não possuísse esse projeto, seria muito provável que eu ainda estivesse em casa, cuidando da minha filha ou com problemas sérios para conciliar os horários dela com os meus. Aqui, também, é uma excelente escola. Vejo minha filha aprender e me sinto segura, porque estou perto – revela.

A situação de Bruna não foi diferente de Elaine. Voltar a estudar depois de ter se tornado mãe, é quase sempre um problema. Bruna acredita que se não tivesse encontrado o Carmelinha, ela teria parado de estudar.

– Para retornar aos estudos, primeiro teria que achar alguém de confiança para ficar com o Alexandre, o que já seria um problema. Com isso, a minha prioridade passaria ser de estudar para trabalhar – afirma.


Aqueles que pensam que não ter com quem deixar os pequenos é um problema exclusivo das adolescentes, enganado. Magda Iorá Marques, 27, se casou antes de concluir o ensino médio. Mas a esperança de voltar a estudar permaneceu viva dentro dela. Hoje, mãe de Anthony Marques Batista, 3, Magda elogia a idéia do Carmelinha e se diz ser uma das privilegiadas por causa do local.

– Depois que meu filho nasceu, fiquei dois anos sem estudar justamente porque não havia ninguém para tomar conta dele. Consegui uma vaga para ele aqui e o matriculei. Durante todo o ano viemos juntos para escola, o que é muito legal. Mesmo que eu tivesse que pagar uma pessoa para ficar com ele, eu não ficaria tão tranquila. Meu marido e eu ficamos sossegados – explica Magda.

seja o primeiro a comentar!

Participe aqui!

Design by UsuárioCompulsivo alterado por Marcos Benjamin ^